segunda-feira, 3 de junho de 2013

Profissão que dá sustento a muitas famílias




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Fonte: Jornal de Angola/Cristina da Silva - 2 Junho 2013 

Estão em todos os locais onde há negócios à espera dos clientes, nos grandes mercados, nas pracinhas e até em frente às lojas«. São os roboteiros, jovens e adolescentes, que abandonam cedo a escola para se dedicarem a esta actividade e assim conseguirem o seu sustento e das suas famílias.

Muitos são provenientes do interior. O dinheiro que eles ganham é colocado num saco de plástico e “depositado” num buraco secreto. Fazem poupança durante seis meses e posteriormente investem noutros negócios, como por exemplo a criação de gado.

Jovens e adolescentes do interior viajam das suas terras para Luanda de autocarro ou de táxi, para na capital encontrarem trabalho que lhes garanta a subsistência. Eles aventuram-se a chegar à capital do país, mesmo desconhecendo a cidade. 

Chegar a Luanda são e salvo é a primeira batalha a vencer pelo roboteiro. Ficar em Luanda durante seis meses é outro objectivo. O trabalho incansável e duro é feito com auxílio de um carro artesanal de madeira. Na impossibilidade de obter o carro de mão, as mercadorias são carregadas às costas: bidões de água, materiais de construção, caixas com frescos, refrigerantes e cervejas. 

No mercado do Kifica, no bairro Benfica, logo às primeiras horas do dia a reportagem do Jornal de Angola deu com um grupo de oito jovens a descarregar sacos de carvão transportados do interior num grande camião. O trabalho é animado e é considerado uma “fezada” (bem vindo). “O dia assim já está ganho”, conta Faustino Martinho, que está em cima do camião a passar a mercadoria aos colegas que estão em terra.

Visivelmente animado e já sem a t-shirt, Martinho orienta o trabalho e vai animando os companheiros. “Começámos a descarregar às sete horas e até às dez o serviço termina”, garante o jovem. Com a descarga do carvão ganhou dois mil kwanzas. Martinho é incansáve. Trabalha há três anos como roboteiro. “Fico cansado, mas tenho de trabalhar para ter dinheiro para levar à família”, disse, adiantando que abraçou a profissão por influência de outros amigos. 

Daniel Domingos, de 16 anos, é natural do Cubal. Ele veio a Luanda em companhia de um amigo e vive nas proximidades de um grande de Luanda mercado com mais quatro amigos com quem partilha o quarto. O arrendamento é pago por semestre, período que dura a sua permanência na capital do país.  “Estou aqui há duas semanas e gostodo trabalho e do ambiente”, explica.

Roboteiro e biscateiro

Os roboteiros estão habilitados a transportar tudo, basta ter força física em dia. Para estes jovens nem todo o trabalho é compensador. Mas ainda assim vão a todas. Ninguém rejeita trabalho.

Na Rua Cónego Manuel das Neves, junto ao Mercado do São Paulo quatro jovens, António Pires, João Canhanga, José António e Pedro Chivinda, estão sentados em frente a uma loja de electrodoméstico à espera de um cliente. 

 António, de corpo franzino, é o mais novo do grupo. Tem 16 anos. Em Luanda há dois meses, veio para a capital por intermédio de um primo. Garantiu que “todos os dias conseguimos algum dinheiro no transporte de mercadorias até aos carros ou a casa dos clientes”.  

A alimentação é feita na rua e no final do dia junta-se aos amigos para uma refeição recheada. “De manhã como uma sanduíche e bebo uma gasosa. O almoço não é preocupação. No período da noite, juntamos um dinheiro, compramos fuba, frango ou peixe e cozinhamos. Uma pessoa que faz trabalho de roboteiro tem de comer bem”, conta sorridente. 

Partilha a casa com os amigos e pagam uma renda semestral de dois mil kwanzas. José António está em Luanda pela terceira vez. Este ano considera o trabalho remediável. Por mês, diz o jovem de 25 anos, pode fazer 20 a 30 mil kwanzas. 

José António disse ainda que não trabalha apenas em mercados ou lojas. Muitas vezes é chamado para trabalhar em obras de construção, residências ou festas. “São biscates de algumas horas ou dias em que lucro um pouco mais”, referiu, recusando em dizer os valores que arrecada dessas actividades.

Pedro Chivinda, 20 anos, já esteve empregado numa empresa de saneamento básico. “Era bom porque não ficava muito exposto ao solo e poeira. Eu tinha um horário de trabalho e um carro que apoiava os trabalhadores”, conto, sem contudo explicar as razões que o fizeram abandonar o referido trabalho. 

 
Arrendamento em Luanda
  
A par do trabalho que é feito na rua, os roboteiros procuram juntar-se em grupo para facilitar o pagamento do arrendamento. Muitos deles quando saem das suas províncias já têm a referência de onde é possível trabalhar e a hospedagem. O melhor para eles é estarem próximos do mercado de trabalho para evitarem o pagamento do táxi.  

João Baptista, 18 anos, natural de Quilengues, estudava na quinta classe quando abraçou a ideia de vir trabalhar para Luanda. “Esta é a terceira vez que venho. Fico seis meses e regresso à Huíla para levar dinheiro”, conta. Os pais sabem que está em Luanda e que o trabalho está a corre bem.  

Além do dinheiro que gasta em refeições procura não esbanjar o pouco que consegue com muito esforço para na data prevista de regresso levar uma quantia considerável que satisfaça as suas necessidades, as dos pais e dos irmãos. 

Reconhece que muitos companheiros acabam em caminhos errados, por fazerem uso excessivo de bebidas alcoólicas e por ilusão vivem à margem da Lei.

Pequenos empresários

O trabalho de roboteiro é pesado, mas vale pelo destino que é dado ao dinheiro ganho. 

Pedro Chivinda e João Baptista, ambos com três viagens a Luanda, já conseguiram comprar um terreno e gado nas suas terras de origem.

João Baptista conseguiu comprar cinco cabeças de gado e quando terminar esta temporada de seis meses em Luanda pretende comprar mais duas vacas. 

Pedro Chivinda pretende também aumentar o número de cabeças de gado que tem no seu terreno no Longonjo, Huambo. “ Já fiz uma casa de adobe de dois quartos e agora estou a preparar o terreno para o gado”, disse. Os dois roboteiros contam que um dos segredos da profissão é a poupança. 

Ambos não bebem e evitam fazer muitas amizades. O dinheiro que ganham é colocado num saco plástico e posto num buraco secreto. “Fica mesmo aí em baixo da terra só tiro o dinheiro quando estamos de partida”, garantiu.  

Os roboteiros são passíveis de muitos assaltos e violência. São alvos de roubos por parte de marginais na via pública. Há cinco anos nesta actividade, diz ter sofrido vários tipos de violência até por companheiros seus, quando estão sob efeito de álcool. “Muitos só trabalham para beber e fazem confusão com os outros”, disse.

António Israel é roboteiro no mercado da Madeira e considera a actividade lucrativa, mas com muitos problemas. “As pessoas não nos respeitam, mesmo com mercadoria no carro de mão ou às costas procuram atrapalhar o nosso trabalho”, desabafa.
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