domingo, 9 de junho de 2013

Caso Mayombe: Omunga denuncia junto a relatora da onu



José Patrocínio, Coordenador da OMUNGA

REF.ª: OM/  092  /2013
Lobito, 8 de Junho de 2013

C/c: Presidente da República de Angola – LUANDA


À Exma. Sra.
Relatora Especial para o Direito à Habitação Condigna
Att: Raquel Rolnik

           
ASSUNTO: DENÚNCIA PÚBLICA – Demolições do B.º Mayombe, Cacuaco, Luanda

Os nossos melhores cumprimentos.

A OMUNGA é uma organização angolana não governamental sem fins lucrativos, de âmbito nacional que desenvolve actividades em prol dos Direitos Humanos
Tem o estatuto de observador da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos. A sua sede está localizada no Lobito, B.º da Luz, Rua da Bolama, casa 2, Benguela, Angola.
1 – INFORMAÇÕES RECEBIDAS
De 1 a 2 de Fevereiro de 2013, foram partidas as residências cerca de cerca de 5000 pessoas no bairro do Mayombe, município do Cacuaco, Luanda.

De acordo ás informações, as demolições tiveram início por volta das 5H00 com enorme aparato militar e policial. Segundo o Pambazuka http://www.pambazuka.org/pt/category/comment/86274/printSete helicópteros, forças militares, policiais e de segurança, estimadas em mais de 500 efectivos, tomaram parte numa operação de demolições do bairro residencial Mayombe, no município de Cacuaco, em Luanda, a 1 de Fevereiro passado.
De acordo com os relatos dos moradores, o dispositivo militar e policial destacado no local de madrugada surpreendeu e causou pânico às populações locais. “Por volta das 5h00 da manhã, os bulldozers começaram o seu trabalho de desalojamento de mais de 5,000 pessoas”, afirmou Mateus Virgílio Mukito, um dos moradores.

Sem qualquer aviso prévio, e sem processo de negociação, a Administração municipal efectuou as demolições. Há relatos de mortes durante a acção. Ainda de acordo ao Pambazuka: “Por sua vez, Pedro Sebastião, outro desalojado, disse ao Maka Angola que duas crianças morreram no acto. “Elas fugiam dos helicópteros assustadas e acabaram por cair numa vala de drenagem”. Esta informação foi corroborada por outros moradores. Segundo o interlocutor, devido ao pânico que se instalou na comunidade, nem sequer foi possível a realização do óbito no local. “Os corpos foram resgatados por uma equipa de bombeiros e transportados para a casa-mortuária, onde os familiares foram resgatá-los e fizeram o óbito num dos bairros periféricos de Luanda”, disse Pedro Sebastião.

O morador Paulo Miranda contou ao Maka Angola que “os helicópteros voavam a poucos metros de altitude”.

As demolições prosseguiram no dia seguinte, na presença de uma força mais reduzida, que incluía dois helicópteros, 15 carrinhas policiais, oito veículos da Polícia de Intervenção Rápida e quatro viaturas das Forças Armadas Angolanas (FAA).

“Isso é terrorismo de Estado. Desalojam as pessoas, de forma desumana, porque os indivíduos que estão no poder querem vender os terrenos aos milionários e aos estrangeiros”, lamentou Mateus Virgílio Mukito, um outro morador que ficou sem tecto.

No local, o cenário é desolador. Centenas de moradores mantêm-se nos escombros do que eram as suas habitações.

Os cidadãos desalojados foram transportados em camiões com alguns dos seus haveres e depositados no Kaope-Funda numa área de valas e relevo irregular, sem qualquer tipo de construção ou infra-estruturas básicas. Nos últimos dias, as autoridades têm abandonado milhares de desalojados do bairro Mayombe nessa zona, criando uma situação de potencial desastre humanitário. http://www.uiovn.com/m.vp.m0X0GSqLcGk

Durante as demolições várias mulheres tiveram os seus partos sem qualquer assistência. Teresa Paulina repousava nos escombros, com uma chapa a cobri-la e ao seu recém-nascido do sol. Deu à luz ali mesmo, nos escombros. Não tinha palavras para descrever a situação em que se encontrava. Pouco mais disse, para além do seu nome. Os moradores confirmaram mais dois partos ocorridos durante as demolições, sem que as autoridades tivessem manifestado qualquer compaixão ou preocupação em evacuar as parturientes ou prestar-lhes alguma assistência no local.

Ao mesmo tempo, vários cidadãos queixam-se terem ainda sido multados e outros detidos conforme entrevistas disponibilizadas pela SOS Habitat na internet http://www.frequency.com/video/vitimas-das-demolies-do-mayombe-detidos/85240318

Por outro lado houve o impedimento do acesso ao local por jornalistas e por membros de partidos da oposição como descreve a Voz da América (http://m.voaportugues.com/a/1608102.html)
UNITA quer inquérito parlamentar a demolições no Cacuaco
Centenas de pessoas perderam as suas casas e ficaram ao relento e muitas delas foram posteriormente julgadas e condenadas por ocupação ilegal de terras.
Para além da divulgação da acção por alguma mídia e ter-se verificado uma grande onda de contestação e solidariedade através das redes sociais, bem como posicionamentos e iniciativas individuais ou colectivas (Aléxia Maria https://secure.avaaz.org/po/petition/Fim_aos_desalojamentos_forcados_de_pacatos_cidadaos/ Novox http://www.no-vox.org/spip.php?article303&lang=fr e Human Right Watch http://www.omunga.org/text/angola-inumeras-detencoes-e-condenacoes-apos-despejos-forcados/253), não tem sido suficiente para que haja uma mudança da situação.
Até ao presente momento, não se verificaram quaisquer iniciativas para a melhoria das condições de vida dos desalojados do mayombe, permanecendo em Kaope-Funda.

Outros links relacionados com o assunto:
1 – VIOLAÇÕES
Tomando em consideração as informações recolhidas,
a)      O Governo Provincial de Luanda não efectuou o processo de informação e de negociação prévia;
b)      O Governo Provincial de Luanda usou de força desproporcional e violenta
c)      O Governo Provincial de Luanda não respeitou o Direito à Vida ao não sisponibilizar toda a assitência às mulheres e aos seus filhos nascidos durante a ação de demolições
d)      O Governo Provincial de Luanda não providenciou quaisquer condições compensatórias sejam novas residências, sejam indemnizações

2 – ANTECEDENTES
a)      Human Rights Council. Fourteenth session Agenda item 6 Universal Periodic ReviewReport of the Working Group on the Universal Periodic Review* Angola  24 March 2010

130. To carry out indispensable urban rehabilitation and reconstruction in accordance with the relevant legislation and internationally accepted human rights standards (Portugal);
131. To adopt legislative measures strictly defining the circumstances and safeguards related to eviction, and to stop all forced evictions until such measures are in place (Netherlands);
132. To consider intensifying efforts to achieve further gains in the areas of poverty reduction; the right to adequate housing; the right to health, water and basic sanitation; and the right to education for all sectors of society (Malaysia);

b)     Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos - Observações Finais sobre o Relatório Periódico Cumulativo (2º, 3º, 4º e 5º) da República de Angola 12ª Sessão Extraordinária 30 de Julho – 4 de Agosto de 2012, Argel, Argélia

XIII.          Adopção de medidas apropriadas visando a proibição da expropriação e despejos forçados sem consulta prévia, e assegurar indemnização adequada relativamente a pessoas que tenham sido alvo de acções de despejo;

c)      Discurso de abertura proferido pela Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navi Pillay, na conferência de imprensa durante a sua missão em Angola (Luanda, 24 de Abril de 2013)
Como fiz menção anteriormente, a expropriação de terras para o desenvolvimento é uma questão que frequentemente desperta grandes preocupações. Reconheço que o Governo deve ocasionalmente expropriar terras para a realização de projectos necessários para o desenvolvimento de uma economia próspera e moderna. No entanto, as pessoas nunca devem ser desalojadas, nem as suas habitações demolidas, sem consulta prévia, remuneração adequada e habitação alternativa a ser disponibilizada para os visados.
Muitos assentamentos informais em Angola são o produto de um deslocamento causado pela guerra ou pela extrema pobreza. As pessoas que vivem nelas devem ser tratadas com sensibilidade. Questões como a proximidade do seu novo local de residência em relação ao seu local de trabalho precisam ser levadas em conta, senão os seus meios de subsistência poderão ser destruídos juntamente com as suas casas e dignidade. Existem normas internacionais claras sobre a apropriação de bens e realojamento de pessoas. Sugeri que o Governo aceitasse a visita do Relator Especial da ONU sobre o direito à habitação adequada e sinto-me feliz por terem concordado com a visita. Missões de uma série de peritos independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos - da qual Angola é actualmente membro – seriam igualmente proveitosas.
d)     Demolições em Menongue a 9 de Abril de 2013
Outras acções de demolições e desalojamentos forçados foram desenvolvidas também noutras partes do país como descreve a Amnistia Internacional na sua petição sobre os acontecimentos em Menongue a 8 de Abril de 2013. No dia 9 de Abril, o administrador municipal de Menongue chegou ao bairro Aeroporto Comandante Kwenha, em Menongue, uma cidade na província do Kuando Kubango, no sudeste de Angola. Ele disse à comunidade que teria que sair da área porque o terreno em que vivia estava reservado a utilização pelo Estado, que tem que assegurar que não existem residências num raio de 200 metros de distância do aeroporto vizinho. O administrador afirmou ainda que existe um plano do governo para o resto dos terrenos, mas não deu mais pormenores. Horas mais tarde, nesse mesmo dia, o administrador regressou ao bairro, alegadamente com agentes da polícia, agentes dos serviços de Inteligência e Segurança do Estado e um veículo de demolição. O motorista do veículo recebeu instruções para demolir cerca de 40 casas enquanto a polícia assegurava a protecção do seu motorista e do administrador.
A polícia alegadamente recorreu a armas de fogo, nomeadamente disparando tiros, contra os que protestavam contra a destruição das suas casas. Durante as demolições, oito indivíduos foram presos por tirarem fotos das demolições e por partirem as janelas do veículo. Seis dos manifestantes foram libertados dentro de dois dias e dois permaneceram detidos até 15 de Abril.

3 – RECOMENDAÇÕES
Recomendamos que a Sra. Relatora interceda junto do Presidente da República de Angola, no sentido de:

1 – O Estado angolano respeitar e cumprir com as recomendações e decisões dos diferentes organismos internacionais de Direitos Humanos

2 – O Presidente da República pôr fim imediato às demolições e desalojamentos forçados

3 – O Presidente da República pedir desculpas às vítimas das demolições e desalojamentos forçados e à Nação, pela gravidade destas acções

4 – O Estado angolano iniciar um processo acelerado de construção de habitações sociais com condições de habitabilidade e de acesso aos serviços básicos como àgua canalisada, energia eléctrica, saneamento, educação, saúde e rede de transportes para todas as vítimas destes processos realizados até à data

5 – O Estado angolano iniciar um processo de justa indemnização para todas as vítimas destes processos realizados até à data.

6 – O Estado angolano efectivar o convite à Relatora Especial das nações Unidas para o Direito à Habitação Adequada para que efectue uma visita a Angola. Nessa visita deve incluir visitas a comunidades afectadas por desalojamentos e demolições, bem como encontro com organizações de defensores de direitos humanos que trabalham nesta temática.

7 – A Assembleia Nacional aprovar uma lei que proteja os direitos dos cidadãos em situação de demolições e desalojamentos forçados


Sem qualquer outro assunto de momento, aceitem as nossas cordiais saudações

José António M. Patrocínio

Coordenador
←  Anterior Proxima  → Página inicial

0 comentários:

Enviar um comentário